Estante da Prima

Toda tarde era mágica...
Na sala de tacos encerados,
de sofá vermelho e confortável.
Da estante de verniz amarelo, 
palavras me espreitavam, acenavam para mim.
Tocar não podia, vó não permitia,
os livros eram da prima.
Moça culta e bela, professora,
cujo olhar imprimia um respeito indiscutível.
Entretanto, a curiosidade infantil tecia estratégias.
Vó adormeceria, siesta, para descansar os 
olhos dos quais nasciam flores, desenhos
e tramas de crochê.
Então seria o momento, dedos minúsculos
retiravam da estante os livros que sorriam.
Um a um, marcando com um farrapo de papel o espaço.
E quando se ouvia o “Ahamm...” da vó descansando
iniciava-se a viagem por países estranhos.
James, Jane, Peter conversavam 
e “rir ainda era o melhor remédio”.
Substantivos e advérbios pululavam.
Artigos acadêmicos com palavras tão bonitas e difíceis.
O tempo voava qual Pegasus,
A tarde escorria entre os dedos,
Vó tossia acordando, era hora de procurar o espaço de cada livro que voltava a 
seus domínios.
Eles se despediam de mim como pessoas, e meu rosto um leve sorriso 
iluminava.

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