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Mostrando postagens de 2017
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Estante da Prima Toda tarde era mágica... Na sala de tacos encerados, de sofá vermelho e confortável. Da estante de verniz amarelo,  palavras me espreitavam, acenavam para mim. Tocar não podia, vó não permitia, os livros eram da prima. Moça culta e bela, professora, cujo olhar imprimia um respeito indiscutível. Entretanto, a curiosidade infantil tecia estratégias. Vó adormeceria, siesta, para descansar os  olhos dos quais nasciam flores, desenhos e tramas de crochê. Então seria o momento, dedos minúsculos retiravam da estante os livros que sorriam. Um a um, marcando com um farrapo de papel o espaço. E quando se ouvia o “Ahamm...” da vó descansando iniciava-se a viagem por países estranhos. James, Jane, Peter conversavam  e “rir ainda era o melhor remédio”. Substantivos e advérbios pululavam. Artigos acadêmicos com palavras tão bonitas e difíceis. O tempo voava qual Pegasus, A tarde escorria entre os dedos, Vó tossia acordando, era hora de procurar o espaço
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Dona Carmozina (Minha avó) Hoje enquanto emendava alguns "squares" de crochê para uma colcha, me lembrei da minha avó, ela fazia crochê brilhantemente e foi observando ela trabalhar que aprendi alguns pontos. Não era minha avó de sangue, mas permeia minhas lembranças de infância como se fosse. Mulher forte e enérgica trazia o cabelo arrumado em um coque no alto da nuca, usava vestidos rodados que marcavam a cintura e no rosto vincado brilhavam dois olhinhos miúdos e espertos. Meu pai, adotivo, quando se referia a ela usava a forma carinhosa "minha mãe" que eu achava de uma ternura sem igual. Muitas vezes o vi de chapéu entre as mãos e cabeça abaixada levando uma bronca como só os meninos levam de suas mães. Morei com minha avó um tempo, precisava estudar e minha família vivia em um sítio, ela me tratava como uma neta de sangue dava bronca, cobrava responsabilidade nos afazeres da casa e vez ou outra me ensinava crochê. Nessas tardes em que me ensinava, falava
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Meu Tabuleiro de Damas Eu tinha uns nove para dez anos e morava com minha avó Carmozina na cidade para frenquentar a escola, pois meus pais moravam no sítio e não havia como estudar por lá. Era fim de ano, meus pais com muita dificuldade, sempre compravam um brinquedinho para que o Natal não passasse em branco e meu pai dizia que o brinquedo não era grande coisa, pois até o Papai Noel subir a serra onde ficava o sítio, só havia sobrado no saco do bom velhinho aqueles presentes  mais simples, a gente acreditava, criança naquela época era mais inocente. Mês de dezembro e minha tia Eli, chegara à casa de minha avó para passar as festas de fim de ano. Que alegria ver os primos! Um menino e três meninas, meus primos favoritos. Dona de uma personalidade controversa e forte, essa irmã mais moça de meu pai era considerada de temperamento difícil, mas comigo sempre foi atenciosa, lhe guardo ternas recordações. Todos na sala, sentados no sofá vermelho, conversavam sobre os presentes d
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INDO PARA O TRABALHO Pelas manhãs, pelos pontos, pela luz que irradia do sol nascente, às vezes pela garoa fria que corta a pele intermitente. A rua vista da janela do ônibus, da janela dos meus olhos límpidos e parcos. Já tão cansados de olhar. O mundo que se vê nos olhos da pessoa, da moça no assento ao lado que olha absorta a tela de rostos coloridos no instagram. Os raios do sol que se apagam pela janela baça do corredor de calçadas marcadas por tantas pegadas já esquecidas. Os perigos, o adormecimento dos sentidos, a não capacidade dos ouvidos embotados pelos fones que gritam uma realidade qualquer sob medida.             A solidão ausente do que foi perdido, o distanciamento do que foi vivido confere uma atmosfera irreal à memória. Na janela embaçada pelas respirações matutinas eu passo por mim, por você, por todos que ainda caminham inexpressivamente, não há WhatsApp que configure tamanha dor. Minha janela passa pelo rapaz que não vê o mundo, que não sente o mundo. Ele
O Artista não chora somente disabores. Chora sutilmente, suas mágoas e temores. Leva consigo, apaziguados, na alma. Os horrores. Do tédio e da incompreensão. Da vaidade desprovida de valores. Artistas são pessoas loucas... Abençoada loucura. Abençoada brandura, ternura. Artistas transpiram suaves olores. E no decorrer da jornada. Mesmo que a vida não lhes pareça um campo de flores. Artistas não choram lágrimas comuns Choram cores...
Disseram-me que poemas são gotas de lágrimas, Que acrósticos são soluços libertos do peito. As crianças me perguntam: "E as palavras, o que são as palavras?” Eu respondo que as palavras são a chave para se prender o sentimento. Significado e significante, como dizia o velho mestre, Às vezes, convenções apenas. Não! Eu me recuso a acreditar, a aceitar o convencional. Sou pelas palavras como expressão do "ser", "estar", "sentir", Sinto as palavras como vergalhão em brasa que dilacera a carne da alma. Tenho as palavras como instrumento do meu labor. Alguém me disse que palavras, são imprecauções incautas soltas ao vento. Eu digo que palavras, para nós que vivemos delas, são dardos certeiros, são punhais afiados, são facas de dois gumes. Podem ser o "mote", podem ser a "sorte" a que todos estão sujeitos.